A
paz nunca veio. Mas você me apareceu pela janela.
Sentou-se
entre o abajur e meus sonhos, e sussurrou para dentro de meu ouvido. Eu fiquei
quieta e olhei Setembro, sentado sério ao meu lado esquerdo... Ele deu de
ombros e ergueu o jornal, estava ali apenas de passagem... Ainda estávamos em
fevereiro.
Você.
É
sobre você que eu me preocupo, porque hoje vem como fantasma... Quando real
fugiu-me a mão e meus dedos ficaram a buscar os seus em um mar distante. Meus
dedos apenas encontraram algas, e eu me enganei quando achei que estas poderiam
ser âncoras. Você mesmo disse que não viria, mas eu esperei mesmo assim.
Insistindo em algo que nunca sequer existiu... A não ser para mim.
Agora
me volta como fantasma, que nem foge a janela, nem aos pensamentos... Não posso
expulsá-lo de casa... Porque quando pensei que o havia feito, apenas o guardei
seguro em uma caixa, que se abriu com o mais leve dos sorrisos doces...
Fica
agora a vontade de novamente te trancar...
...
Você
acaricia de leve meus cabelos. Faz a morte, que vive enroscada por esses fios,
desaparecer. Desembaraça os nós... Sem nos desembaraçar...
Se
eu pudesse fazer a gente ficar juntos eu fazia, mas não posso.
Setembro
reclama alguma coisa a respeito da data, e a respeito do frio... Ele sabe
melhor das coisas que estão por vir, das que já aconteceram, e dessa repetição
tediosa e ainda assim uma surpresa para mim. Ele aconselha a desiludir para não
chorar, mas eu, mais iludida do que nunca, escuto sempre vagamente, juntando
palavras para que elas venham a ser o que eu queria que fosse. Só depois descubro
que ouvi errado...
Pergunto
a seu fantasma onde você esta, ele nada me responde... Pergunto como você esta,
ele não me responde... Pergunto quando, porque, quem e o que você esta, dessa
vez ele apenas me suspira. Não vai dizer... Eu sei, porque já perguntei outras
vezes, todas as vezes que me apareceu esse pequeno pedaço, que é luz e sonho,
que também é parte de você.
Desisto
e silencio-me.
Você
apenas segura minha mão. Um toque leve... Inexistente.
Quando
o sono quase vem e o sonho é quase vida, você me solta a mão, e num passo
fantasmagórico passa para fora da janela e se vai. Num susto eu me levanto,
corro a tempo de segurar os panos que você usa... Se fossem correntes eu até
tinha uma chance de te arrastar, mas corrente alguma te prende... Nem pano, nem
laço algum... Fossem cadarços eu ficava feliz, mas não há nada... E minhas mãos
apenas sentem o ultimo breve suspiro de sua presença que se vai, sem nem mesmo
um adeus.
Indo, nunca tenho
notícias suas, a não ser o que vejo pelo lado de fora da janela... Um mundo
inteiro que eu não pertenço, mas que você é capaz de pertencer... Tão distante.
Fico
parada esperando. Esperar é algo que sei fazer bem...
Mas
Setembro me murmura algo, que na verdade é “sai” e eu ouço “vai”. E então
espero, porque ele me disse que posso ir, e se eu for ainda há chance de dar
certo. E mesmo quando não vou a janela, que digo, não volte, que chore e que
fique... Ainda assim lá esta a pais a iluminar o caminho... Ela é âncora, e com
o mais leve dos carinhos, o mais ingênuo dos sonhos, mostra todo o caminho a
você, nem que eu me esconda no fundo das prateleiras de livros e dos
certificados curriculares, ainda assim, você consegue me encontrar por causa da
pais. Ela é âncora, que transcende a mim e se ascende a ti...
Caminho
estranho...
Eu
mesma não sei bem o que ela é. Mas temo muda-la de lugar e te perder...
Estranho medo de saudade, que ninguém jamais pode sobreviver...
Espero...
Num
silêncio nervoso... Numa espera infinda...
Num viver de
vontades bobas... Vontade imensa de me afogar. Vontade imensa de fazer parte.
Vontade imensa de entrelaçar meus dedos nos seus e falar sobre literatura...
Coisas bobas. Viver juntos, almoçar juntos, ter gatos e filhos juntos e nada
mais...
De
ter vento nos cabelos...
De
ter as estrelas de seus olhos para mim... Como você tem as minhas...
De
ter paz e ter pais e ter o céu acima...
De
saber que a rosa e o sentimento que plantei não apodreceram...